Preconceito, pré-conceito ou preferência?

Artigo de André Soares - 27/10/2014

 

 

O político corrupto “Justo Veríssimo“, personagem do inigualável humorista Chico Anysio; e o assoberbado “Caco Antibes”, personagem interpretado pelo ator Miguel Falabella no consagrado programa humorístico “Sai de Baixo”, têm algo em comum: ambos têm ojeriza a pobres. E o mais importante: manifestam isso publicamente: "Tenho horror a pobre!". Todavia, a despeito de “Justo Veríssimo“ e “Caco Antibes” serem personagens de abjeta conduta pessoal, há que se reconhecer que ambos têm uma virtude: a coragem de dizer o que pensam, principalmente ideias “politicamente incorretas”. Inevitavelmente, a maioria das pessoas os condenará por inadmissível preconceito contra as pessoas pobres. Contudo, há uma grande incompreensão que acomete a sociedade, que não sabe diferenciar preconceito, pré-conceito, ou apenas simples preferência.

 

Preconceito, em termos gerais, constitui ilicitude relativa a fomentar ou dar tratamento indigno ou discriminatório a qualquer pessoa, em razão origem, raça, sexo, cor, etnia, religião, procedência nacional, etc  Destarte, vivemos num mundo de preconceito não apenas contra pobres, mas também contra mulheres, negros, homossexuais, muçulmanos, imigrantes, etc.

 

Contudo, a “liberdade de pensamento e de expressão” são direitos consagrados em nossa Carta Magna, em seu art. 5º, inciso IV: “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”; e em seu inciso IX: “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”. Portanto, assumindo a autoria de suas ideias, qualquer pessoa pode manifestar a opinião que quiser.

 

Dessa forma, a manifestação de “Justo Veríssimo“ e “Caco Antibes” dizendo ter ojeriza a pobres, assim como manifestar-se dizendo não gostar qualquer outra coisa, não constitui ilícito algum. Porque se trata de opinião que representa apenas simples preferência pessoal. Afinal, você e todas as pessoas também têm suas preferências “politicamente incorretas”, não é mesmo? Pois, então saiba que não há ilícito algum em dizer isso. Só é preciso coragem.

 

Adentrando ao mérito da questão, vale perguntar: Por que “Justo Veríssimo“ e “Caco Antibes” não gostam de pobres?

Resposta: Pelos mesmos motivos que você e todas as pessoas nesse mundo não gostam de algo.

Pergunta: E o que faz com que as pessoas gostem ou não gostem de alguma coisa?

Resposta: O pré-conceito.

 

Pré-conceito consiste no conjunto de ideias e valores individuais, adquiridos previamente pela experiência de vida, constituindo parâmetro de julgamento pessoal. Portanto, “Justo Veríssimo“, “Caco Antibes”, você e todas as pessoas, possuem seus respectivos pré-conceitos, que determinam suas opiniões e preferências pessoais.

 

Todavia, se por um lado é legítimo que as pessoas tenham seus pré-conceitos e manifestem suas preferências livremente; por outro lado é importante destacar que o exercício indevido do direito à liberdade de expressão pode ensejar o cometimento de ilícitos. É o caso dos crimes contra a honra (calúnia, difamação e injúria), relativos à ofensa contra a pessoa ou à sua reputação; ou no caso da apologia a ilicitudes, como o racismo, o preconceito, a discriminação e a prostituição, por exemplo.

 

Portanto, é importante saber diferenciar preconceito, pré-conceito, de simples preferência porque há sutilezas significativas quanto seu emprego na vida prática, com as quais se deve ter muito cuidado. Porque a manifestação de “Justo Veríssimo“ e “Caco Antibes” dizendo "Tenho horror a pobre!" é apenas mera preferência pessoal. Porém, a manifestação de ambos dizendo "Quero que pobre se exploda!" trata-se de grave e inadmissível preconceito.


 

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