Petrobras e Abin

Artigo de André Soares - 05/08/2015

 

 

 

O Procurador-Geral da República (PGR) Rodrigo Janot, em 31/07/2015, na cerimônia de restituição de R$ 139 milhões de reais aos cofres da Petrobrás recuperados na Operação Lava Jato, reiterou veementemente ao país duas afirmações que merecem uma maior reflexão. Disse o PGR que: “a Petrobrás foi vítima da ação cruel de criminosos”, e que “não existe cidadão acima da lei”. Nesse contexto, é importante salientar que na atual conjuntura nacional há controvérsias.

 

Como é notório, a magnitude e gravidade dos crimes cometidos no Petrolão são dos mais ingentes da história da indústria petrolífera mundial, vem causando há décadas incalculáveis e astronômicos prejuízos ao país, e envergonhando e desprestigiando o Brasil perante a comunidade internacional. A despeito do inequívoco desvirtuamento institucional da Petrobras nesse episódio, infelizmente vem sendo disseminado no país um ardiloso discurso político, no qual a Petrobras é alçada à condição de vítima, obscurecendo a responsabilidade criminal que cabe aos dirigentes máximos da maior empresa petrolífera do país, por sua degenerescência.

 

Inverte-se insidiosamente assim a verdade e a lógica dos fatos. Porque, ao contrário, nos âmbitos, legal, ético, moral, e principalmente jurídico, no qual atuam o MPF, a Polícia Federal e a Justiça, a Petrobras atuou como protagonista nesse escabroso festival de crimes contra o estado, seja pela ação ou pela inação de seus dirigentes máximos. Caso a Petrobras fosse uma instituição sadia e virtuosa, como obrigatoriamente devem ser as instituições nacionais, a exemplo do eminente MPF, Polícia Federal, Justiça, dentre outras insignes instituições, certamente o Petrolão não teria acontecido, por mais cruéis que fossem os criminosos partícipes e por mais agressiva que fosse a ação corrupta de governantes e partidos políticos. Portanto, a verdade é que as únicas vítimas do Petrolão são o estado brasileiro e a sociedade.

 

Destarte, para fazer valer no país que “não existe cidadão acima da lei”, implica em responsabilizar também, no âmbito das apurações da Operação Lava Jato, os dirigentes máximos da Petrobras, em coerência e a exemplo da atuação do próprio MPF no histórico julgamento do Mensalão. Lembremos que no Mensalão o MPF valeu-se da doutrina do “domínio do fato” para denunciar e condenar o ex-ministro Chefe da Casa Civil José Dirceu, sob a égide jurisprudencial que imputa à autoridade pública investida em cargo de direção ou chefia a responsabilidade direta pelos ilícitos cometidos em sua gestão. Assim, por elementar analogia jurídica, a teoria do “domínio do fato” se aplica também e de forma ainda mais evidente ao Petrolão, alcançando inescapavelmente os presidentes da Petrobras.

 

Quando fui ao Ministério Público Federal (MPF), em 17/06/2015, denunciar no Inquérito Civil Nr 1.16.000.001529/2014-39 as ilicitudes perpetradas pela Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) na Operação Mídia, reveladas pela revista Veja na matéria “Liberdade sob ataque”; denunciei também outras graves clandestinidades da agência contra o estado, reveladas no livro “Ex-agente abre a caixa-preta da ABIN”, que escrevi em parceria com o jornalista Claudio Tognolli, que são mais graves que o Petrolão, porquanto comprometem a segurança nacional.

 

Todavia, desde 2008, quando a ABIN perpetrou um festival de crimes contra o estado na Operação Satiagraha, que não encontram precedentes na história contemporânea dos serviços secretos no mundo; mesmo depois da agência ter sido condenada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 2011; e novamente pelo Supremo Tribunal Federal (STF) este ano, todos os seus dirigentes envolvidos permanecem completamente impunes. Até onde se sabe, sequer foram investigados.

 

A guerra contra o câncer da corrupção no Brasil não será vencida apenas pelo esforço cívico e pontual de insignes instituições; especialmente diante do caótico estado de metástase a que chegaram muitas instituições no país, a exemplo da ABIN e a Petrobras. A tão sonhada nova era na qual “não existirá cidadão acima da lei” no Brasil, somente será inaugurada pela coragem das autoridades públicas em aplicar impiedosamente o ordenamento jurídico a todos, indistintamente, e começando exemplarmente a partir dos governantes do país e dirigentes máximos institucionais, os quais não podem ficar incólumes e abençoados pela impunidade, como ainda persiste em acontecer escandalosamente no Brasil.


 

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